8 de dezembro de 2012

Química e Teatro



        Atualmente, temos visto o desenvolvimento e ações no campo da educação não formal e sua importância. Um dos temas utilizado pela educação não formal é tratado neste texto, e refere-se à utilização das artes cênicas, ou seja, do teatro, como forma de ensino e difusão do conhecimento.
        Na história sobre o teatro, vemos a utilização do mesmo como proposta pedagógica. Na Grécia antiga, Aritófanes já o fazia em 414 a.C. quando lançou As aves, peça com críticas ainda hoje atuais aos jovens e ao sistema educacional. Se tomarmos a Grécia como ponto de partida do desenvolvimento do teatro, encontraremos que, por ocasião da colheita das uvas, eram promovidas homenagens a Dionísio, deus do vinho, da fertilidade, da fonte da vida e do sexo. Durante os festejos anuais, formavam-se procissões e cortejos, ao som de canções improvisadas entoadas por jovens em giros dançantes. Surgem nessas manifestações os primeiros registros do uso coletivo do canto, da dança e da representação. Este é, para muitos, o berço do teatro que nasce como forma coletiva de arte, utilizando-se de várias linguagens.
 Shepherd-Barr (2003) descreve em seu artigo o sucesso de peças que falam sobre ciência como Copenhagem e After Darwin e mostra que a teatralização dos temas faz brilhar a substância científica abordada. A interdependência das propriedades formais e temáticas é uma marca desse gênero contemporâneo de peças científicas, apresentando desafios inovadores e provocativos ao realismo dos palcos.
Triffaux (1999) descreve em seu artigo a ambiguidade que caracteriza a relação ciência-teatro, a primeira destas atividades sendo intelectual e racional, enquanto a segunda é um complexo fenômeno humano e artístico. Tal ambiguidade é causada pela influência positiva que uma exerce sobre a outra e pela própria separação que a cultura impõe em diferentes campos do conhecimento.
Montenegro (2005) cita algumas peças desenvolvidas pela Seara da Ciência, órgão da UFC (Universidade Federal do Ceará).  
“Algumas peças apresentadas a seguir mostram a trajetória e as contribuições de grandes cientistas como Einstein, Lavoisier e Darwin, por meio de monólogos, que são um breve resumo de suas biografias. Os ilustres personagens recebem a plateia em seus “laboratórios” e estes são envolvidos na trama.”
·      Em Einstein, procuramos enfatizar a teoria da relatividade e os estudos que foram realizados em uma cidade no interior do Ceará no início do século passado. Em um dos trechos ele diz: “... — (...) E tem mais, vocês sabiam que a minha teoria, ( da relatividade) só foi comprovada em 1919, aqui em Sobral, por ocasião de um eclipse?...”

·           Sobre Lavoisier, se explica à platéia a importância de seu trabalho no campo da química: “... — (...) Vocês conhecem este livro? (capa do livro está escrito Traité éleméntaire de chimie ) — Foi como seu lançamento, em 1789, que nasceu a química moderna, e eu passei a ser conhecido como o pai da química! Pois, até aqui, reinava a alquimia! O conteúdo do livro trata, entre outras coisas, da unificação da nomenclatura utilizada para determinar os elementos, e se tornou o marco fundamental da química!...”.
Ainda, Montenegro nos fala sobre outra peça:
“O nosso ‘carro-chefe’ tem sido a Bioquímica em cena, de Marcus R. Vale, uma peça que tem como objetivo abordar, em linguagem simples e divertida, as relações metabólicas mantidas entre vários sistemas do organismo humano. Ela prevê um elenco de oito atores que representam como personagens órgãos do corpo, que discutem entre si sobre qual deles é o mais importante. Cada um enfatiza suas qualidades metabólicas, mostrando que, sem ele, o seu dono não sobreviveria. A peça mostra que todos os tecidos possuem características bioquímicas especiais que os diferenciam uns dos outros, sendo exatamente essas diferenças que possibilitam ao nosso corpo funcionar de forma integrada, elegante e perfeita. Quando cada um cumpre seu papel metabólico o equilíbrio é mantido, isto é, atingimos a homeostase.”
 Abaixo a transcrição de um dos diálogos da peça:
“... Fígado — Bem,... com exceção da hemácia. Mas essa gasta tão pouca energia... que eu nem faço muita questão... Mas tu... além de não armazenar a glicose ainda usas demais!... Imagine!... 60% da glicose do corpo és tu que queimas! Mesmo quando ele (o músculo) está em repouso.
Cérebro — As tarefas nobres que tenho de realizar gastam muita energia mesmo, meu caro. É isso aí! C’est la vie. 
Músculo — Como já dizia Einstein, tudo é relativo. Aliás, eu preferiria dizer que tudo é muuuuito relativo! Por exemplo , essa história de gasto de energia... Esses tais 60% de glicose que o fígado mencionou aí... Fichinha, meu nego. Qualquer exerciciozinho que o nosso corpo fizer, quer dizer, que eu fizer, consome essa glicose aí bem ligeirinho!
Cérebro — É, esse tipo de atividade “não intelectual” deve gastar mesmo muita energia... a minha glicose!...
Músculo — É... realmente adoro uma coisinha doce logo no começo do meu trabalho de contração. Depois,... bem,... depois de algum tempo, um acidozinho-graxo me cai muito bem. Até porque esse daí não precisa da insulina para poder entrar em mim. Já chega e vai entrando sem pedir licença. E é muito bem-vindo porque tem muito mais energia do que a glicose. E para um tecido importantíssimo como eu... ”
As peças citadas acima, é um pouco de muitos trabalhos teatrais que estão sendo produzidos em nosso país, podemos citar alguns grupos como Espaço Ciência- PE, Casa da Ciência- UFRJ, Estação Ciência- USP-SP, Arte e Ciência no Palco- SP, Alquimia- UNESP- Araraquara, CDCC-USP- São Carlos e Ouroboros- UFSCar.  


Foto do elenco da peça “Quimitaverna”. Química em Ação, grupo de teatro do Instituto de Química da USP.

Este tipo de abordagem não formal, em toda encenação teatral, busca ao mesmo tempo aliar o entretenimento com temas científicos, conceitos da ciência, história da ciência, entre outros. Constitui-se portanto em uma ótima ferramenta para o ensino e difusão dos saberes da química e da ciência.

                Por Davi Villela

Abaixo uma peça completa apresentada pelo grupo Química em Ação da USP-SP, com o título “A química na história” postada pelos autores no site youtube.

Pequenos trechos de algumas peças teatrais do grupo de teatro “Arte Ciência no Palco”(ACP).



Apresentação do Grupo “Fabula da Fíbola” e da Peça “Larguem tudo, vamos voar!”.
      
Referências:
·         MONTENEGRO, B., FREITAS, A. L. P., MAGALHÃES, P. J. C., SANTOS, A. A., VALE, M. R.,2005. O Papel do Teatro na Divulgação Científica: A Experiência da Seara da Ciência. Ciência e Cultura, 57(4): 31-32.
·                  Roque, Nidia Franca. Química por meio do Teatro. Química Nova na Escola, 25, 19-22, 2007.
·         Shepherd-Barr, Kirsten. From Copenhagen to infinity and beyond: science meets literature on  stage. Interdisciplinary Science Reviews, 28 (3), 193-199, 2003.
·         Triffaux, Jean Pierre. Science and theater at the end of the nineteenth century: An ambiguous relationship. Revue D Histoire Du Theatre, 51(3) 197-210, 1999.
·          Pignarre, R. História do teatro. 3-ª edição, Coleção Saber. Publicações Europa – América. Portugal. 1979
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